Ensaio sobre a introdução

Comecei a brincar com as palavras antes da maioria. Lembro-me de andar na pré-primária e já sabia ler e escrever na perfeição. Não aprendi sozinho. Tinha uns cadernos muito pequenos que a minha educadora me deu para treinar. Em casa, fechado no compartimento da botija de um aquecedor a gás, ia treinando as palavras associando letras aos desenhos. Recordo com saudade aquele cantinho onde tantas vezes me escondi para evitar as provocações dos meus irmãos e a ira do meu pai que sempre detestou ver-nos agarrados aos livros. Talvez venha daí o meu profundo afastamento de tal criatura… Daí e de muitas outras coisas que hoje não cabem aqui, nesta crónica… Não sendo prodígio, comecei a ler e a escrever antes mesmo de deixar de fazer chichi na cama e não fiz chichi na cama até tarde (quando entrei na primária há muito tinha parado de o fazer). Era de tal maneira adiantado para a idade que as professoras chegaram a ponderar fazer-me avançar para a terceira classe. A minha mãe não deixou e bem! Tudo tem o seu tempo e o seu espaço. Provavelmente estaria (ainda) mais à frente do que a minha idade. Para além do mais eu era um “meio quilo” de gente. Minúsculo. Quase anão. Enfezado e com um ar doente que chegava a dar dó… Criei uma relação secreta com as letras. As palavras tornaram-se quase visuais e as letras as minhas companheiras de viagem… Comecei a escrever poemas aos 8 anos de idade. Talvez um pouco mais cedo. Eram coisas tontas sobre os sonhos e as coisas que queria ter. Eram as árvores e os pássaros… Na adolescência escrevi coisas patéticas sobre o Amor. Perderam-se cartas lindíssimas de inspiração pura (e não de pura inspiração…). Cartas que só as lamento por estarem perdidas na confusão de quem não as merecia. Durante anos fiquei longe da escrita. Não escrevi contos nem livros nem sequer pequenos textos. Foi a minha condenação por querer ser como toda a gente. Se para todos é normal e institivo se afastarem do que mais gostam para se dedicarem a quem amam, para mim foi um longo penar. Reencontrei-me neste blog. E o que antes era uma produção louca de poesia (guardo cadernos inteiros…) tornou-se numa refinada escolha de temas e palavras. Tudo isto para dizer que dificilmente voltarei a escrever poesia. Ficar-me-ei, até ao fim dos meus dias, pela prosa livre e o pensamento solto. Bem, tudo isto para dizer que muitos desses pensamentos têm as minhas palavras e o meu tom romanceado mas na realidade  as ideias originais não são minhas. Eu vivo para dentro e extravaso o que penso por aqui. Não é por isso de admirar que em algum momento, numa leitura mais atenta, alguém diga: hey, mas isto vem a propósito do que hoje, ontem ou há dias falámos… Este ensaio fugiu do meu controle e com tanta introdução, acho que já não tenho espaço para escrever sobre o que queria… Após uma conversa interessante com uma amiga, surgiu a ideia do texto que amanhã escreverei. Ai, que parvo que eu sou…

 

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